Como Desenvolver um GIS – Parte 3

Acompanhe agora a terceira e última parte da série sobre como desenvolver um GIS. Apenas para relembrar, na primeira parte desta série de postagens vimos quais são as etapas básicas do processo de desenvolvimento de um Sistema de Informações Geográficas (SIG) e comentamos especificamente as fases de aquisição de manipulação dos dados. Já na segunda parte tratamos das etapas de análises e gerencia dos produtos.

Agora vamos considerar sobre Geoprocessamento, SIG e tomada de decisão. O diagrama abaixo destaca que etapas do SIG nós estamos estudando.

SIG - Estapas

Visualize nesta momento que o SIG é um sistema que atua no suporte à tomada de decisão, integrando dados espacialmente referenciados em um ambiente de respostas a problemas.

Com isto em mente vamos comentar um trabalho desenvolvido há alguns anos em minha cidade, João Pessoa, no tocante a localização de equipamentos públicos, como é o caso de postos de saúde.

EXEMPLO PRÁTICO DE SIG NA TOMADA DE DECISÃO

A tecnóloga em Geoprocessamento, Sandra Patrícia Alfonso da Silva, no ano de 2006, desenvolveu uma aplicação SIG para localização ou realocação de Unidades de Saúde da Família (USF), mais conhecidos como Postos de Saúde da Família (PSF).

Ela observou uma necessidade de utilização de sistemas deste tipo para sintetizar as diversas informações envolvidas e que as contextualize na paisagem, o que facilitaria a escolha de um local mais adequado para o posto de saúde, de modo à atender de maneira mais satisfatória a população abscrita.

A partir da estruturação de um banco de dados e da realização de análises espaciais, foram elaborados mapas temáticos. Com base nestes mapas foi possível sugerir três possibilidades de localizações para a unidade PSF (I) do bairro do Rangel, consideradas sob determinados critérios, como sendo melhores do que a localização atual. que de alguma forma pudessem apoiar uma decisão quanto à melhor localização para o PSF.

Vamos entender os critérios e métodos utilizados neste excelente projeto elaborado pela Sandra, que atualmente trabalha no departamento de Cartografia do INCRA, aqui na Paraíba. Mas primeiro é interessante saber algumas das características básicas da localidade.

ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DA ÁREA

O mapa abaixo apresenta a localização do posto de saúde, objeto do estudo. A unidade atendia na época 817 famílias cadastradas. Note desde já que o posto (lote em vermelho) não está numa posição central da área a ser atendida pelo mesmo.

Localização PSF I

  • SANEAMENTO BÁSICO

De acordo com dados de 2005, a  maioria das edificações (99%) tem abastecimento de água. O destino das fezes em sua maioria (653 casas, 81% do total) vai para fossas sépticas, (130 casas, 15% do total) sistema de esgoto e (34 casas, 4% do total) a céu aberto. O destino do lixo em sua maioria (719 casas, 88% do total) é coletado. Em apenas 15 casas (1,8%) o lixo é queimado ou enterrado e em 83 casas (10,2%) o lixo fica a céu aberto.

  • CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DA ÁREA

A área possui um grave problema com relação às barreiras geográficas (veja a imagem abaixo), as quais dificultam muito o trabalho dos agentes de saúde. O acesso ao bairro se dá por duas avenidas principais: Quatorze de Julho e Dois de Fevereiro que possuem um transito intenso, sendo que a primeira dá acesso ao bairro de Jaguaribe e Centro, e a segunda dá acesso a bairros como, Cristo, Geisel, José Américo, Mangabeira. Das onze ruas da área de abrangência do PSF (I) do Rangel apenas 2 (duas) são asfaltadas.

Fotografia de um dos "abismos" existente na região

CRITÉRIOS PARA ESCOLHA DA NOVA LOCALIZAÇÃO

As análises espaciais disponibilizadas pelo Sistema de Informação Geográfica possibilitaram a seleção de seis critérios para o estudo de uma nova localização para o a unidade de saúde da família.

1. Distância aos Usuários

O problema de má localização do PSF/USF(I) sempre existiu, e nunca foram realizados estudos prévios de avaliação da localização quando da implantação de algum posto na região.

Para analisar a distância da população usuária do PSF/USF(I), sob o ponto de vista da centralidade de um equipamento urbano tão importante, pode-se tomar como referência  os logradouros mais centrais da área de estudo, que neste caso eram a Avenida Dois de Fevereiro e a Rua Cônego Vicente. A partir do mapa gerado, percebe-se que uma mudança de localização do  posto  para algum lote da área mais central ou para algum lote próximo a ela, facilitaria o acesso da população adscrita.

Análise de proximidade/Mapa de distâncias às principais vias de acesso

2. Tipologia dos Logradouros

O tipo de pavimentação de cada logradouro (asfalto, paralelepípedo, solo exposto, etc) pode ser considerado um fator de acessibilidade ao posto de saúde, especialmente para os idosos, mulheres com crianças  pequenas, pessoas em cadeiras de rodas, bem como para o acesso de quaisquer meio de transporte ao local em caso de emergências.

Tendo bor base este critério, selecionam-se os seguintes logradouros: Dois de Fevereiro, Quatorze de Julho, Mourão Rangel, Parte da Cônego Vicente e da São Marcos.

3. Presença de Acidentes Geográficos

A área possui diversos acidentes geográfios, verdadeiros “abismos”, como o já mostrado acima.  Geralmente, estas barreiras se localizam no final de cada rua. Estes abismos atrapalham o trabalho dos agentes comunitários de saúde, e, por consequência, em algumas áreas, a população acaba não recebendo a visita deles.

Assim, os lotes que ficam próximos da área onde há barreira geográfica foram ser excluídos da análise, pois, se o posto for realocado para as proximidades destes abismos o problema de acesso da população pode ser agravado.

4. Topografia do Terreno

O mapa abaixo demonstra os níveis de altimetria que a área estudada possui. O modelo numérico do terreno (MNT) foi gerado a partir dos pontos cotados disponibilizados pela prefeitura através de recursos de geração de grades regulares no software de SIG .

Esta informação das altitudes da área pode ser cruzada com outros critérios para estabelecer uma melhor região para a proposta de localização do posto, pois a parte mais alta do bairro pode ser de difícil acesso para quem mora na parte mais baixa e vice-versa.

Modelo numérico do terreno

5. Idade dos Usuários

o ideal é que o posto de saúde fique próximo do maior número de idosos e mães com crianças de colo, pois logicamente esta população tende a ter maiores dificuldades de locomoção.

6. Ocupação Urbana

Foram selecionados os imóveis vagos (sem ocupação no momento da pesquisa) e à venda para a possível localização do equipamento.

RESULTADO OBTIDO

Com base nestes critérios estabelecidos e nos mapas resultantes, algumas consultas foram realizadas, enfocando os lotes vagos e/ou à venda para escolher a melhor localização.

Os lotes definidos como sendo os mais adequados, de acordo com as análises realizadas, foram três lotes situados na Rua Mourão Rangel. Esta rua é bem pavimentada, os lotes estão próximos das áreas mais críticas da região, não estão situados em ladeiras, estão longe dos abismos existentes na região e estão próximos aos logradouros centrais, facilitando o acesso de idosos, mães com crianças menores que 4 anos, pessoas em cadeiras de rodas e veículos. Essa facilidade poderia melhorar inclusive o acesso dos pacientes que residam um pouco mais distante do posto. O mapa abaixo ilustra este resultado obtido.

Lotes para a melhor localização do PSF/USF(I) do Rangel segundo análise espacial realizada

Enfim, este exemplo mostra que a implementação de uma aplicação de SIG, voltado para o estudo e análise de melhores localizações de equipamentos urbanos é uma ferramenta eficiente para auxílio na tomada de decisão.

Muito interessante este trabalho desenvolvido pela Sandra, não é verdade? Você pode fazer o download da versão em PDF do trabalho, clicando aqui .

Embora tenham sido utilizados programas proprietários em seu projeto, nada impede que sejam utilizadas ferramentas open source para realizar os mesmos procedimentos.

É importante destacar que diferente do que alguns pensam, o SIG não é de forma alguma a única tecnologia do Geoprocessamento.

Leia as postagens indicadas abaixo para conhecer melhor algumas dessas e conceitos básicos relacionados:

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Anderson Medeiros

Anderson Medeiros

Graduado em Geoprocessamento pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB). É o autor do site https://clickgeo.com.br que publica regularmente, desde 2008, artigos dicas e tutoriais sobre Geotecnologias, suas ferramentas e aplicações.
Em 2017 foi reconhecido como o Profissional do ano no setor de Geotecnologias. Atua na área de Geoprocessamento desde 2005.

Artigos relacionados

13 respostas

  1. Genial seu site, postagem de 2010 estou lendo e aproveitando, já que se passaram 3 anos!! Muito interessante voce deixar tudo arquivado, foi facil de encontrar e ler as series de Como desenvolver um gis.
    Parabéns!

  2. Excelênte postagem. Se tiver alguma coisa sobre incêndio urbano não esqueça de nós! Parabéns Mestre Gedai do Geo!

  3. MUITO INTERESANTE, SOU ENFERMEIRA E TRABALHO EM UMA UNIDADE ONDE FUNCIONAM QUATRO EQUIPES TRABALHANDO EM UM ÚNICO ESPAÇO FÍSICO, A ESTRUTURA FÍSICA É ÓTIMA: SALAS CLIMATIZADAS, SISTEMA DE ATENDIMENTO INFORMATIZADO, EQUIPAMENTOS NOVOS,MUITO ESPAÇO,SÓ FALTOU UM LOCAL MAIS APROPRIADO PARA REUNIÕES E COLETA DE EXAMES.MAS, MESMO ASSIM, 2 EQUIPES ESTÃO COM SEUS PACIENTES COM O ATENDIMENTO PREJUDICADO DEVIDO A GRANDE DISTÂNCIA DA UNIDADE EM RELAÇÃO A ESSAS ÁREAS. ISTO JÁ FOI SINALIZADO, MESMO ASSIM ESTÃO COM PROJETO PARA CONSTRUÇÃO PARA OUTRAS UNIDADES IGUAIS A ESTA. GOSTARÍAMOS DE AJUDAR A EVITAR QUE COMETAM O MESMO ERRO E PARA ISTO ESTAMOS BUSCANDO POSSÍVEIS SUGESTÕES.
    VOCÊ PODERIA NÓS DÁ OUTRAS INFORMAÇÕES DENTRO DESSA TEMÁTICA.
    GRATA DESDE JÁ!!!!

  4. Nice blog !! i also know a very good site for gis software apps.cybertech.com !!!

  5. Muito didática e prática sua explicação. Gostaria de sugerir uma nova série sobre Geoprocessamento aplicado à arqueologia.
    Abraço.

    1. Olá Jonas, tudo bem? Agradeço o elogio.
      Sobre sua sugestão, não vou garantir uma série, mas pelo menos vou abordar esse tema em uma matéria sim. Ok? Fique na expectativa.
      Um abraço!

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Sobre Anderson Medeiros

Ele já foi reconhecido como o Profissional do Ano no Brasil no setor de Geotecnologias. Graduado em Geoprocessamento, trabalha com Geotecnologias desde 2005. Já ministrou dezenas de cursos de Geoprocessamento com Softwares Livres em diversas cidades, além de outros treinamentos na modalidade EaD. Desde 2008 publica conteúdo sobre Geoinformação e suas tecnologias como QGIS, PostGIS, gvSIG, i3Geo, entre outras.

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